segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Carlos Lopes Pereira / União Africana critica Ocidente

União Africana
critica Ocidente

Carlos Lopes Pereira*
08.Feb.16 :: Outros autores
Segundo a Jeune Afrique, Mugabe (…) atacou os ocidentais, que «estão em todo o lado na África»: Se não estão directamente, é por intermédio das ONG, de espiões, de impostores que pretendem vir aqui para nos ajudar. Mas que ajuda nos trazem eles?».


O presidente Robert Mugabe, do Zimbabwé, terminou o mandato de um ano como líder em exercício da União Africana fazendo duras críticas ao Ocidente, em especial aos Estados Unidos.
Falando na abertura da 26.ª Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da organização pan-africana, que decorreu em Adis Abeba a 30 e 31 de Janeiro, o veterano combatente da liberdade zimbabweano acusou Barak Obama de ser «a voz do dono», de fazer o que lhe mandam, de estar ao serviço das classes dirigentes estado-unidenses.
Num discurso interrompido por frequentes aplausos dos seus pares, Mugabe exigiu que a África disponha de assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Afirmou que a sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, «está mal situada» e ficaria melhor na Índia, onde vivem 1,2 mil milhões de pessoas, ou na China com uma população de 1,3 mil milhões, ou na África, com mais de mil milhões de habitantes. E foi irónico com o secretário-geral cessante das Nações Unidas, que assistiu à cimeira na capital etíope: «Os patrões, no Conselho de Segurança, dizem: “Vocês [os africanos] não tereis nunca o mesmo poder que nós, os membros permanentes”. Nós pedimos, pedimos e pedimos: reformai o Conselho de Segurança. O Sr. Ban Ki-monn é um bom homem mas não podemos fazer de si nosso combatente. (…) Se as Nações Unidas querem sobreviver, nós devemos ser, ali, membros iguais. (…) Sr. Ban Ki-moon, já lhes disse [aos patrões] que nós somos também seres humanos?».
Segundo a Jeune Afrique, Mugabe, com a experiência dos seus 91 anos, atacou «os ocidentais», que «estão em todo o lado na África»: «Se não estão directamente, é por intermédio das ONG, de espiões, de impostores que pretendem vir aqui para nos ajudar. Mas que ajuda nos trazem eles?».
Esta cimeira, que decorreu sob o lema «2016 – Ano Africano dos Direitos Humanos, dando primazia aos Direitos da Mulher», abordou a paz e segurança, a guerra em países como o Sudão do Sul, a República Centro-Africana e o Mali, a luta contra o Boko Haram – que continua a espalhar o terror no Nordeste da Nigéria, nos Camarões, no Níger, no Chade –, a tensão política no Burundi, os problemas dos migrantes e refugiados, o desenvolvimento económico do continente.
Contra o TPI
Para suceder a Mugabe na liderança rotativa da União Africana, foi eleito o presidente Idriss Déby, do Chade. Exercerá o cargo até Junho de 2016, data prevista para a próxima cimeira da União Africana, em Kigali, capital do Rwanda.
No poder há um quarto de século, Déby é um dos principais aliados da França na África Central, tendo feito do seu país uma potência militar regional, com intervenções recentes, apoiadas por Paris, na República Centro Africana, no Mali, na Nigéria e na bacia do lago Chade. A capital, N’Djamena, abriga o quartel-general da Operação Barkhane, que dá cobertura à presença militar da França no Sahel, um dos pólos da sua política neocolonialista.
Outros assuntos mereceram destaque na reunião de Adis Abeba.
Sobre o Burundi, face à recusa categórica de Bujumbura de permitir tropas estrangeiras no seu território, a União Africana decidiu enviar uma delegação de «altas personalidades». O objectivo é negociar com o presidente Nkurunziza, procurar resolver o conflito político interno e travar a crescente tensão com o vizinho Rwanda, de contornos étnicos entre hútus e tutsis.
No quadro do combate ao Boko Haram, representantes da comunidade internacional reuniram-se já esta semana na capital etíope e prometeram mobilizar 250 milhões de dólares. A soma destina-se a financiar a força de intervenção conjunta multinacional que intervém na Nigéria e nos estados vizinhos. Calcula-se que, só em 2015, as acções do movimento radical islamita tenham causado 3500 mortos e 190 mil deslocados.
Soube-se também que a assembleia dos chefes de Estado aprovou, à porta fechada, uma proposta visando estabelecer um roteiro para a saída dos países africanos do Tribunal Penal Internacional (TPI). A proposta partiu do presidente Uhuru Kenyatta, do Quénia, cujo vice, William Ruto, enfrenta acusações da instituição. De igual modo, o presidente Omar el-Béchir, do Sudão, é alvo do Tribunal que, por sua vez, tem sido considerado um instrumento das potências ocidentais que «só persegue dirigentes africanos» com acusações «politizadas e infundadas».
No exacto momento em que o TPI começou a julgar em Haia o ex-presidente Laurent Gbagbo, da Costa do Marfim, a União Africana reafirmou que o princípio da imunidade dos chefes de Estado, aplicado à escala global, deve ser válido também para a África.
* Jornalista
Este texto foi publicado no Avante nº 2.201 de 4 de Fevereiro de 2016.
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Um comentário:

  1. Mugabe, com a experiência dos seus 91 anos, atacou «os ocidentais», que «estão em todo o lado na África»: «Se não estão directamente, é por intermédio das ONG, de espiões, de impostores que pretendem vir aqui para nos ajudar. Mas que ajuda nos trazem eles?».
    Amaro:Mugabe,velho sábio africano

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